Enquanto uma atividade empresarial, a gestão de escritórios de advocacia pressupõe resultados, lucro e enfrentamento da concorrência. Nos tempos atuais, podemos acrescentar mais um fator: a tecnologia. A evolução e a inovação tecnológica estão transformando todos os setores da economia, inclusive os negócios jurídicos.
Pensando em como os gestores de grandes e pequenos escritórios podem se preparar, a empresa de consultoria americana The Boston Consulting Group (BCG), em parceria com a faculdade de Direito Bucerius Law School, da Alemanha, publicou um relatório sobre como a tecnologia está transformando os negócios jurídicos. A pesquisa foi publicada em 2016, e muito do que se previa já começa a virar realidade. Todavia, ela apresenta insights ainda válidos referentes ao cenário da advocacia e aos modelos de gestão de escritórios.
Para os pesquisadores, nos últimos anos, algumas forças estão reformatando o mercado jurídico. Há uma pressão nos preços, uma vez que os clientes exigem mais por menos. O que antes era uma atividade homogênea, o serviço jurídico está se desconstruindo em diversas atividades mais especializadas. Existe também uma tendência de terceirizar alguns processos.
Por fim, a digitalização das informações jurídicas e o crescente volume de dados também está transformando o mercado. Todos esses aspectos vêm sofrendo influência das legal techs, que entregam soluções tecnológicas cada vez mais especializadas. E isso tanto para a gestão dos escritórios quanto diretamente para os clientes.
“Nossas descobertas enviam uma mensagem clara: os escritórios de advocacia não podem mais se dar ao luxo de ignorar as legal techs. No cenário em transformação das empresas jurídicas, haverá vencedores e perdedores. Para assegurar sua competitividade no futuro, os escritórios devem estar preparados para alterar partes fundamentais de seus modelos de negócios a fim de capturar as oportunidades advindas das tecnologias para o Direito”, afirma o relatório.
Mapeando o cenário das legal techs
O relatório do BCG divide o cenário das legal techs em três grandes categorias. Cada uma delas representa soluções para diferentes níveis da gestão dos escritórios de advocacia.
A primeira delas são as tecnologias facilitadoras. Elas são focadas em facilitar a digitalização do escritório em uma camada mais ampla. São soluções voltadas para a infraestrutura das plataformas de segurança digital, conectividade e nuvem, por exemplo. Muitas delas não são fornecidas por empresas especializadas em tecnologia jurídica.
A segunda categoria são as soluções de suporte a processos. Não estamos falando aqui especificamente do processo judicial, mas dos processos internos da empresa, como gerenciamento de recursos humanos, de documentos, do financeiro e de relacionamento com clientes.
A terceira categoria são soluções jurídicas propriamente ditas. Estas auxiliam diretamente o trabalho dos advogados – e, em muitos casos, os substituem, executando tarefas que podem ser automatizadas. São tecnologias aplicadas diretamente em serviços como contencioso. Aqui também estão incluídas inovações, como inteligência artificial, machine learning, big data, quando aplicadas ao contexto do Direito.
Os impactos na gestão de escritórios (pequenos ou grandes)
As legal techs não representam apenas soluções para facilitar a rotina dos advogados ou a gestão dos escritórios. Na verdade, elas estão transformando o mercado como um todo, desequilibrando a competição empresarial.
Por ora, segundo o relatório, as tecnologias jurídicas se voltam principalmente a automatizar tarefas repetitivas. Mas elas já caminham para solucionar problemas cada vez mais especializados e feitos sob medida para os advogados. De 2016 (quando o estudo foi publicado) para cá, este cenário vem se confirmando.
Isso tudo afeta a gestão dos escritórios, sejam eles grandes ou pequenos. E de acordo com o porte, os imperativos para essa adaptação mudam:
Novos imperativos para gestão de grandes escritórios
A eficiência e a redução de custos provocadas pela adoção de soluções tecnológicas é algo a ser esperado também dos grandes escritórios de advocacia por seus clientes. A isso, se soma a pressão dos escritórios concorrentes e das próprias legal techs, que cada vez mais passam a oferecer serviços especializados.
O BCG prevê uma profunda mudança no modelo de negócios dos grandes escritórios. A atual estrutura organizacional tem o formato pirâmide, em que no topo estão os sócios, no meio os advogados seniores, com o apoio de terceirizados, e na base os advogados juniores mais os serviços terceirizados e as soluções de automação.
Esse formato dará lugar a um modelo de “foguete”, composto por advogados experientes fazendo parte do quadro do escritório, apoiados bilateralmente por gestores de projeto e especialistas fora do Direito, e pelas soluções tecnológicas e seus controladores. Conforme o quadro comparativo abaixo (em inglês).
Novos imperativos para os pequenos escritórios
Escritórios de pequeno porte não têm estrutura e condições de competir de igual para igual com as grandes firmas ou até mesmo empresas de tecnologia. Por isso, precisam se adaptar em dois aspectos.
O primeiro deles é na proposta de valor. Em vez de buscar uma atuação mais generalista, na busca pela maior quantidade de casos possível, será preferível se especializar. Seja em determinada área do Direito ou em um pequeno grupo de casos. Com isso, será possível ganhar escala e oferecer um serviço mais eficiente para o nicho escolhido.
O segundo aspecto é revisar o modelo de operação. Como dissemos, é impossível competir com as empresas de tecnologia que podem oferecer serviços jurídicos se baixa especialidade. Por isso, a gestão dos escritórios de pequeno porte deve alavancar o uso dessas soluções para operar de forma mais barata e eficiente. Com isso, conseguem baratear seus custos e ganhar espaço dentro do nicho específico.
Conclusão
A pesquisa conjunta da BCG e da Bucerius provê importantes insights para a gestão dos escritórios de advocacia. Muito do que era previsão no relatório, já está se tornando realidade. A tecnologia jurídica e as empresas de legal techs estão cada vez mais presentes na realidade da advocacia. Cabe às firmas, sejam elas grandes ou pequenas, buscarem as adaptações necessárias para permanecerem vivas num cenário de alta competitividade.